Em outros posts aqui no blog, já abordei o tripé do tradutor para dublagem referente aos principais materiais com os quais lidamos. Recapitulando: o script com a transcrição das falas no idioma original, o vídeo da produção e o arquivo da tradução que será enviado para o estúdio. No entanto (e infelizmente com uma frequência maior do que eu gostaria), o material nem sempre é nosso amigo, logo é preciso realizar uma análise o mais rápido possível para tentar minimizar os percalços que podem ocorrer ao longo do processo tradutório.

No post de hoje, separei três coisas que podem dificultar a vida do tradutor se não forem detectadas desde o começo. Vamos dar uma olhada nelas?

Para muitos que ainda não estão inseridos na área da tradução para dublagem, o que vou dizer agora pode parecer um choque, mas praticamente qualquer novo projeto não deixa de ser um tiro no escuro. Por mais que a gente busque tatear a produção com a qual vamos lidar antes de aceitar e por mais que a gente se cerque, não tem como saber 100% da dificuldade que o projeto nos trará. Não digo isso apenas levando em conta o conteúdo / temática da produção que pode se mostrar mais difícil do imaginávamos inicialmente como também o material em si que recebemos do estúdio, material esse, por sua vez, oriundo do cliente que encomendou a dublagem.

Como o nosso foco hoje é referente ao material, fui percebendo, ao longo dos anos, que existem problemas muito comuns e recorrentes, então, sem mais delongas, vamos a eles!

1) Scripts incompletos ou não correspondentes à versão do vídeo que será traduzido

O que vale para o tradutor sempre é o vídeo. Sempre, sempre e sempre. O script com a transcrição das falas é um material de apoio, pois imagina se tivéssemos que traduzir sempre tudo de ouvido? O grande problema é que os scripts podem ser aliados maravilhosos ou os nossos piores inimigos. Eles podem vir com falas inteiras faltando ou com personagens trocados, isso só pra listar alguns dos possíveis empecilhos.

Entretanto, acho que o pior que pode acontecer é quando o script não bate com a versão do vídeo que o tradutor tem em mãos. Isso já aconteceu uma vez comigo e foi uma das minhas experiências mais traumáticas. Infelizmente, a verdade é que não dá pra conferir o script com o vídeo de cabo a rabo antes de dizer ao estúdio se aceita ou não a produção, não temos todo esse tempo.

Uma forma não infalível, mas que é melhor do que nada é, se possível, pedir o vídeo, baixá-lo e realizar um cotejo breve dos cinco primeiros minutos entre o vídeo e o script e repetindo isso em algum momento no meio da produção e nos minutos finais. Se não houver grandes disparidades, é provável que você tenha o script certo em mãos, mas, ainda assim, não é garantia. Em casos de séries e desenhos, por exemplo, os primeiros episódios são determinantes para o tradutor. Se estiver tudo certo com os scripts iniciais, é provável que fique tudo bem até o fim da temporada.

Ainda nessa questão, existe algo chato que também pode acontecer: a minutagem das falas no script não condizer com a minutagem mostrada no vídeo. Recapitulando: a minutagem ou Time Code serve para os dubladores saberem quando suas falas começam. Se isso não acontecer, na maioria das vezes, sobra pro tradutor corrigir a minutagem. Ossos do nosso nada mole ofício.

O ideal é detectar esses problemas o mais rápido possível e comunicar ao estúdio para ver se é possível fazer algo como pedir um novo material ao cliente ou, se tiver que sobrar pro tradutor mesmo, pedir um pouco mais de prazo.

2) Vídeos com baixa qualidade de áudio e imagem

Como o que vale para nós, tradutores, sempre é o vídeo, é imprescindível termos um material com boa qualidade de áudio e imagem. Ao longo dos anos, já lidei com vídeos de 1GB e de 300 MB. Ter uma boa internet é fundamental para poder baixar os vídeos rapidamente e conferir esse quesito. Infelizmente, se a qualidade estiver muito, muito ruim, é possível comunicar ao estúdio para que seja solicitado outro vídeo ao cliente, mas geralmente o que o estúdio recebe é o que vale.

Ah, e como uma leitura bônus, já fiz um post dando uma dica muito legal pra você se prevenir quando o vídeo não quiser abrir no seu PC. Se você não conferiu, é só clicar aqui!

3) Adequar o tipo de arquivo de tradução ao projeto/ cliente

Por mais que no Brasil, a maioria dos arquivos de tradução para dublagem sejam realizados no Word, existem diferentes modelos, não só entre os estúdios como também entre os clientes. Por exemplo, tem arquivos em que o texto precisa ficar dentro de uma tabela específica e outros em que basta inserir uma coluna de tradução dentro do próprio script original. Cada caso é um caso, e cada cliente é um cliente, não tem jeito. Pode parecer coisa de maluco, mas nada que a prática e um bom curso não possam te dar uma boa noção. Basta saber que a essência é sempre a mesma, só muda a roupagem. 😉

Mas você pode se perguntar: “E o que isso afeta o trabalho do tradutor na execução em si da tradução?” É o fato de que, dependendo da roupagem pedida, ou seja, do tipo de arquivo que precise ser enviado ao cliente, o tradutor terá mais ou menos trabalho, pois, como você pode imaginar, o script traduzido oriundo a partir de um modelo em branco enviado pelo estúdio dará muito mais trabalho do que se o projeto permitir que se crie apenas uma coluna de tradução ao lado do script original e com todas as minutagens das falas já inseridas.

E aí? Gostou das dicas de hoje? Não se esqueça de deixar o seu comentário e até o próximo post! 😉

Paulo Noriega

Sou autor do blog Traduzindo a Dublagem e tradutor atuante nas áreas de dublagem e editorial. Amo poder compartilhar meu conhecimento a respeito do universo da dublagem e da tradução para dublagem. Seja bem-vindo a este fascinante universo!

4 Comentários

Raul Rocha

4 de março de 2019

Incríveis dicas, principalmente para quem gostaria de trabalhar na área, mas ainda não iniciou a jornada.
Gratidão pelo post!

    Paulo Noriega

    6 de março de 2019

    Valeu, Raul! Obrigado!! =))

Sidney Mattos

18 de março de 2019

Eu me acostumei a trabalhar no Excel e só jogar no Word na hora de fazer correção ortográfica e formatar o roteiro. A maioria dos scripts que peguei são tabelas que podem ser copiadas para o Excel. É mais fácil manipular e pesquisar informação nele. A não ser que o script não venha como tabela. Aí não tem jeito, é fazer do zero mesmo.

    Paulo Noriega

    1 de maio de 2019

    Oi, Sidney! Talvez seja porque você tem lidado com produções Netflix, acertei? Se for o caso, sim esse novo formato tem ganhado muito espaço nessa indústria. Mas existem diversos estúdios e que atendem outros clientes e que, de forma geral, ainda impera o formato de fazer tudo no Word. 😉

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