Dando continuidade ao post da semana passada, nesta segunda parte vamos explorar as duas grandes etapas posteriores ao processo de tradução/adaptação: o processo da dublagem em si e o de pós produção. Caso ainda não tenha lido a primeira parte, é só clicar aqui!

O PROCESSO DA DUBLAGEM

No momento da dublagem de um produto audiovisual dentro de um estúdio, temos um tripé formado pelas figuras dos dubladores, do diretor de dublagem e do técnico de áudio. Abaixo explico de forma mais aprofundada as respectivas funções desses profissionais.

Os dubladores: os dubladores são atores registrados no SATED (Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões) com seus registros de ator emitidos pela DRT (Delegacia Regional do Trabalho). São os profissionais que vão dar vida e interpretar o texto traduzido/adaptado das mais diversas produções audiovisuais (filmes, séries, documentários, etc…), e diferentemente do que se observa com os atores que trabalham na televisão, cinema ou teatro, por exemplo, os dubladores não ensaiam previamente para viver seus personagens.

Na realidade, todos os dubladores são atores, mas são atores que se especializaram nessa modalidade específica da dublagem, assim como outros se especializam em outras áreas como tv, cinema ou teatro, por exemplo. É imprescindível para esse profissional ter uma boa dicção e o poder de conseguir passar toda a emoção possível para o seu personagem somente por intermédio de sua voz.

Diferentemente do que acontecia décadas atrás em que os dubladores gravavam suas cenas em conjunto, hoje em dia, cada um as grava de forma separada em horários agendados pelas casas de dublagem. Em relação ao momento das gravações, uma vez escalado para um dado papel, o dublador precisa encarnar o personagem com o qual está tendo contato pela primeira vez, e com o texto traduzido a sua frente (em cima de uma bancada), tem de sincronizar as falas traduzidas com a boca do personagem.

Dublador em estúdio
Dublador em estúdio

Além disso, o dublador precisa ter bons reflexos, de modo que consiga alternar o seu olhar entre o texto traduzido e o produto que será dublado, exibido em uma tv. Tal como foi dito no post anterior, as falas dos personagens são concebidas previamente pelo tradutor, mas é comum haver ajustes durante as gravações, como reavaliar o tamanho das falas ou deixar alguma mais natural caso esteja muito truncada.

O diretor de dublagem: é o profissional que coordena todo o processo de dublagem com o técnico de áudio ao seu lado dentro do estúdio.

Em um primeiro momento, esse profissional que também é dublador, recebe o script já traduzido/adaptado e uma cópia do vídeo do produto audiovisual que irá dirigir. Com a tradução em mãos, ele minuta o filme (alguns estúdios podem pedir isso ao tradutor) e o divide em loops (termo usado no RJ) ou anéis (termo usado em SP). Esses loops são trechos de mais ou menos 20 segundos e são o que determina o total de horas remuneradas dos dubladores.

Feito isso, o diretor faz a escalação dos dubladores que julga serem os mais adequados para intepretar os personagens de uma produção audiovisual. No entanto, há casos em que testes de voz precisam ser realizados para determinar as vozes dos principais personagens. Em casos assim, o diretor escolhe três dubladores que acredita serem boas escolhas para um certo personagem e envia essas amostras de voz para decisão final do cliente.

Uma vez dentro do estúdio para iniciar as gravações, o diretor costuma deixar os dubladores a par da melhor maneira possível sobre a produção que será dublada e fornece informações sobre seus personagens. Suas principais tarefas são coordenar a interpretação dos dubladores e o sincronismo e estimativa labiais. O sincronismo labial, como já foi dito no post anterior, é o processo no qual as falas dubladas precisam ser encaixadas perfeitamente na boca dos personagens, desde o momento em que ela abre até o momento em que ela fecha. Essa tarefa de coordenar o sincronismo e o tamanho das falas pode requerer uma atenção em maior ou menor grau, dependendo do trabalho realizado previamente pelo tradutor.

DIRETOR DE DUBLAGEM
Diretor de dublagem com o técnico de áudio

Outra informação importante é que não é pré-requisito dominar uma língua estrangeira para exercer a função de diretor de dublagem, de modo que erros de tradução podem passar despercebidos, caso o tradutor não tenha feito um bom trabalho de pesquisa, por exemplo.

Técnico ou operador de áudio: profissional que trabalha ao lado do diretor de dublagem na parte da técnica e que realiza a gravação das falas dos dubladores, seguindo as diretrizes dadas pelo diretor. Ele manuseia o protools, o sistema de computador utilizado atualmente nos principais estúdios de gravação e que facilita enormemente o processo de dublagem, pois reúne uma gama de ferramentas para edição, mixagem e masterização. Graças ao protools, há vários canais de áudio disponíveis para captar o som dos vários personagens presentes em um produto audiovisual e é possível diminuir ou aumentar a duração/tamanho de alguma fala, por exemplo.

O PROCESSO DE PÓS-PRODUÇÃO

Após o término das gravações de todas as falas de uma produção, os mixadores nos estúdios precisam mixar as falas dubladas, os efeitos sonoros e a trilha sonora de forma harmoniosa, de modo a compor o produto final dublado. Essa última grande etapa de pós-produção é fundamental para se obter o que chamo de “magia de abstração da dublagem”. E por que digo isso? Porque se o estúdio não tiver um bom aparato tecnológico e bons operadores e mixadores, a produção pode sair com sons não bem equalizados, causando estranheza ao público.

Infelizmente, vemos casos assim em produções mal dubladas em que o som aparenta “estar para fora”, parece algo a parte do filme. Quando isso acontece, fica evidente que a produção está sendo dublada e isso acaba com a magia de abstração que a dublagem tenta trazer.

Por fim, após o fim desse processo, o estúdio envia o produto dublado para o canal que fez o pedido de dublagem e, caso haja algum erro no que diz respeito ao áudio da produção ou em relação à tradução, o produto volta para o estúdio para se realizar o que se chama de retakes, ou seja, consertos. O canal sinaliza para o estúdio as cenas com problemas e os dubladores precisam redublá-las.

Agora que chegamos ao final da análise dessa cadeia da dublagem, é possível ver que é um grande trabalho de equipe. Não adianta ter um bom texto e não ter bons dubladores para interpretá-lo de forma convincente, assim como não adianta ter bons dubladores e um texto ruim e truncado. E também não adianta ter um ótimo texto e ótimos dubladores sem bons profissionais na parte técnica. É necessário que haja uma convergência de bons profissionais atuando nessas três grandes etapas para que se possa chegar a uma produção dublada de qualidade e são por produções assim que devemos almejar!

Espero que tenha gostado de acompanhar essa cadeia do mundo da dublagem e sinta-se à vontade para deixar seu comentário e deixar sugestões para temas futuros! Grande abraço! 😉

Paulo Noriega

Sou autor do blog Traduzindo a Dublagem e tradutor atuante nas áreas de dublagem e editorial. Amo poder compartilhar meu conhecimento a respeito do universo da dublagem e da tradução para dublagem. Seja bem-vindo a este fascinante universo!

2 Comentários

Márcia

2 de abril de 2018

Estou amando acompanhar seu blog.

    Paulo Noriega

    4 de abril de 2018

    Que bom, Márcia. Fico muito feliz. =))

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